quarta-feira, 9 de dezembro de 2015

ANÁLISE FÍLMICA: “PRA FRENTE, BRASIL (Brasil: dir. Roberto Farias, 1982)




ENREDO
No filme, Jofre (Reginaldo Faria), ao dividir um táxi com um militante de esquerda, é tido como "subversivo" pelos órgãos de repressão. É preso e submetido a inúmeras sessões de tortura, por torturadores operantes à margem do Estado, financiados por um grupo de empresários inescrupulosos. 
Miguel (Antônio Fagundes) e Marta (Natalia do Valle) tentam encontrá-lo através dos meios legais, mas se deparam com a relutância da polícia em investigar o desaparecimento. Com o telefone grampeado, Miguel recebe Mariana (Elizabeth Savalla) em casa, ferida após um fracassado assalto a banco. É quando ele fica sabendo da atuação de um grupo de repressão política patrocinado por empresários; as investigações de Miguel prosseguem e levam ao grupo de empresários em que atua seu próprio patrão.



Figure 1. Comemoração do Pelé após gol realizado na Copa do Mundo de 1970

ANÁLISE FÍLMICA
“Pra frente, Brasil” foi interditado pela censura sob a alínea D do artigo 41 da Lei 20.943, de 1946, que previa "interdição quando a obra for capaz de provocar incitamento contra o regime vigente, a ordem pública, as autoridades e seus agentes". A exibição foi liberada por instância superior e sem cortes, estreando em 1983; foi uma das primeiras películas a retratar a repressão da ditadura militar brasileira (1964–1985) de forma aberta. É um filme simples e direto, que chama atenção para as torturas nos “anos de chumbo", mostra que o despertar para os acontecimentos pode acontecer repeninamente. Assemelha-se a um documentário, um lembrete de que não podemos esquecer a ditadura.
O filme aborda justamente os sequestros efetuados pelo governo para exterminar possíveis movimentos subversivos e/ou comunistas. Já na primeira cena temos violência imposta por um grupo de torturadores; também é possível notar a falta de envolvimento político dos personagens.
Em 1970, na época dos anos de chumbo e do dito "milagre econômico", o Brasil vibra com a Seleção Brasileira de Futebol na Copa do Mundo e, enquanto isso, prisioneiros políticos são torturados por agentes da repressão oficial, fazendo pessoas inocentes de vítima também. O futebol aparece em Pra frente Brasil como um elemento importante,  tanto que o início de um novo interrogatório a Jofre é interrompido por causa de uma partida: o Brasil vai jogar e, qualquer tarefa, mesmo de grande relevância, pode esperar os noventa minutos de um jogo que simboliza o sucesso da pátria verde e amarela. A Copa paralisa atividades para que o brasileiro se veja como um vencedor após os 90 minutos.
Dentro de um cenário de repressões, censuras e controle das mídias, pouco se sabia sobre as torturas realizadas com o comando do militarismo. Os “anos de chumbo” ganhavam uma cortina blindada através da publicidade enganosa de crescimento econômico e país de sucesso criada pelo governo. Imagem que era atrelada à seleção brasileira de futebol, que vivia sua grande fase com a chance do tricampeonato; o slogan “Brasil: ame-o ou deixe-o”, exemplificava isso.


Figure 2. Cena de tortura conhecida como "Cadeira Elétrica" durante a Ditatura Militar

ILUMINAÇÃO
No filme, temos:
- cenas escuras: quando o Jofre é torturado, iluminação escura para ressaltar a dramaticidade.
- geralmente as cenas externas são à luz do dia.
- luz clara: ressaltando a felicidade, como por exemplo na cena final em que o Brasil é campeão.

SONOGRAFIA
A sonografia do filme é instrumental, com as seguintes sensações:
- romantismo: quando Miguel e Mariana se reencontram e ela pergunta se pode ficar em sua casa.
- esperança: quando Marta vê que os filhos estão bem, mesmo  sabendo que a polícia foi à casa dela; quando Jofre pensa que escapou dos torturadores.
- suspense: quando Mariana e um companheiro, após uma tentativa de sequestro frustrado em que ela foi baleada, veem um corpo e depois se encaminham à casa do Miguel.
- ação: cenas de tiroteio.
- desolação: no final, quando Mariana morre temos uma música de tristeza; o interessante, é o contraste com a imagens da seleção ao conseguir o tricampeonato.


Figure 3. Discussão entre Miguel e Marta.

CORTES DE CENAS
No começo do filme, temos um travelling, com câmeras fazendo imagem panorâmica no intuito de mostrar a paisagem.
É usado o close, como por exemplo quando os personagens estão vendo o jogo do Brasil: isso mostra a emoção que eles estão sentindo.
O corte meio plano americano, no qual o enquadramento é feito da cintura para cima, presentes em cenas de diálogo.
Em cenas de violência o corte é abrupto, para demostrar quanto a própria cena é violenta.
A maioria das cenas tem o ritmo rápido, com diálogos mais curtos: isso é interessante para contar várias pontos de vista e em cenas de ação.

AUTORES RELACIONADOS
É difícil esperar que existam direitos para os cidadãos durante uma ditadura, muito mais difícil acreditar que seus direitos humanos sejam respeitados. Sem que haja democracia, está implícito que não existe cidadania, justiça, respeito aos direitos humanos e, consequentemente, a paz. Esses conceitos permanecem interligados e interdependentes (BENEVIDES, Maria).
No filme vemos retratados todos esses aspectos: ausência de democracia, de respeito aos direitos humanos - a Jofre e comunistas da época -, de justiça - por não considerarem criminosos os torturadores - e, finalmente, da paz. O desrespeito aos Direitos Humanos durante os "anos de chumbo" trouxeram consequências fatais a milhares de pessoas inocentes e àqueles ligados a vida política da época; essa dívida não foi sanada até os dias atuais, agravando o cenário para os defensores de DH, invisibilizando todo o trabalho de garantir direitos fundamentais, como a vida, à presos políticos da ditadura e o direito a julgamento (justiça) até mesmo daquela classe média que usou de tortura durante a ditadura. ae sendo retratados como defensores de presos comuns. E o fim das necessidades dessa mesma classe média acabaram por deturpar, na mídia, a motivação dos defensores de DH.
Segundo Solon, a questão dos direitos humanos é ligada à memória. As pessoas que foram torturadas e desapareceram, tem esse direito violado. Nosso período de sombras foi a ditadura. No filme “Pra frente, Brasil, o contexto geral para população não era tratar a ditadura como algo ruim e repressivo, na verdade o clima era de festejo. Devido ao “Milagre Brasileiro” e à propaganda oficial, a maior parte acreditava em bons indicadores econômicos (inflação e desemprego baixos, crescimento econômico). A falta de um direito afeta todos os outros. No período em que se passa o filme, tínhamos censura e falta de liberdade, e mesmo que todos os outros direitos fossem atendidos, a falta de um significa a não-cidadania.


Figure 4. Cena de tiroteio ao ar livre. Repressão na Ditadura Militar.



BIBLIOGRAFIA
BENEVIDES, Maria. “Cidadania e Direitos Humanos”,
VIOLA, Solon Eduardo Annes. “Entre silêncios e esquecimentos: a supressão do Estado de Direito durante o regime militar”
https://pt.wikipedia.org/wiki/Pra_frente,_Brasil

Nenhum comentário:

Postar um comentário